Chikamatsu Monogatari 1954 (Japão, 102’). Prod. Daiei, Kyoto (Masaichi Nagata). Real. Renji Mizoguchi. Roteiro: Yoshikata Yoda, Matsutaro Mawaguchi, a partir de Daikyoji Sekireki, de Chikamatsu Monzaemon. Foto: Kazuo Miyagawa. Música: Fumio hayasaka. Int: Kazuo Hasegawa (Mohei), Kyoko Kagawa (Osan), Eitaro Shindo (Ishun), Sakae Ozawa (Sukeemon), Yoko Imanmida (Otama), Haruo Tanaka (Doki), Chieko Naniwam (Oko).
O feudalismo descrito por Mizoguchi: um universo onde cada um tem seu lugar fixado na hierarquia dos deveres e do respeito, onde cada ato é realizado como se fosse em praça pública, onde a ordem assim estabelecida tende a eliminar toda vida privada e liberdade. Mas esta reaparece no amor e no jogo imprevisto das paixões. É uma liberdade trágica que recria, entre os amantes, deveres e um respeito que tornam irrisórios os determinados pela ordem social. No plano estético, semelhante universo convém idealmente a Mizoguchi. Para ele, o “ser” dos personagens só pode existir na intensidade e na tragédia. Cada gesto e entonação, cada sentimento dos dois heróis surge em um presente que é a Eternidade, onde o anedótico, o superficial, o finito não encontram lugar. Intensamente felizes e infelizes, os amantes crucificados transgridem as leis de seu universo social e estão para além de todo e qualquer julgamento. Eles nos aparecem como os únicos verdadeiros seres vivos do filme e, sob este título, exercem fascinação tanto sobre os outros personagens quanto sobre o espectador. A arte, a certeza (dir-se-ia que toda “falta de jeito”- maladresse- lhe é desconhecida), a determinação tranqüila com os quais Mizoguchi põe em obra esta fascinação nos enquadramentos, no grão da foto ou no jogo dos intérpretes fazem dele, ao menos em seu último período, o cineasta por excelência: uma espécie de igual, de contemporâneo na eternidade de um Goethe ou Shakespeare, aos quais, aliás, o material literário aqui utilizado poderia ser comparado.
Jacques Lourcelles. Traduzido por Luiz Soares Júnior.
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