Nova variação sobre a
perversidade, a mentira, a fascinação e a pusilanimidade. Reconhecemos de
passagem os tiques e os tropos de Losey, olhares às vezes vazios, às vezes
ambíguos, com freqüência protuberantes, atores mascotes fiéis a si mesmos e
enfim reunidos ( Bogarde e Baker), relações de mestres a escravos e vice-versa,
fascinadores e fascinados, etc. Em uma universidade inglesa com belas cores, um
professor, ainda jovem ( Dirk Bogarde), complica-se inutilmente a vida. Ele ama
em silêncio sua aluna, Anna, que um jovem corteja e um terceiro já seduzira.
Por covardia, por ser incapaz de desempenhar um papel verdadeiro nesta
história, Bogarde torna-se pouco a pouco confidente, organizador, intermediário.
Ele dá-se a impressão de dar as cartas, enquanto apenas sofre a ação dos
eventos. O personagem de Bogarde acaba por tornar-se fascinante na medida em que
o cinema de Losey mostra-se mais e mais à sua imagem. Cinema cuja marca foi
sempre a busca ( ao mesmo tempo desconfiança e fascinação) do natural, do
espontâneo, do primeiro grau. Qualidades que, é preciso bem admitir, acabaram
por desaparecer de Losey desde que este chegou a Albion ( com exceção de
instantes fulgurantes: Chance meeting). Só subsiste portanto, o artifício sob
todas as suas formas, do desenho animado a um certo “accent inglês”. Observando
Bogarde, vemos como funciona esta alquimia: como o natural se torna fabricado,
o imediato se converte em calculado ( arrière-pensée), o evidente tortuoso,
etc. Podemos achar este artifício insuportável ou comovente “ao segundo grau”.
Acidente é um filme vão e sofisticado onde encontramos todas as aparências do
rigor. Cada cena se articula sobre um pequeno “detalhe significativo” que o
zoom sublinha alegremente. A impressão global é, no entanto, de uma flacidez (
uma flacidez que se enrijece às vezes), para não falar de derrisão.
Serge Daney, Cahiers du cinéma, 191, junho de 1967
Tradução: Luiz Soares Júnior
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