quinta-feira, 8 de janeiro de 2009

Josey Wales, fora da lei, Eastwood

A maioria dos filmes realizados por Eastwood são interessantes, e ele se revelou, desde seu primeiro filme ( Play Misty for fire, 1971) como um dos maiores metteurs em scéne americanos contemporâneos. The outlaw Josey Wales é até aqui o seu filme mais rico e bem acabado- obra marcante da década de 70. Ela possui a dupla dimensão de uma aventura individual e de um afresco cativante dando a ver, na desordem pós-Guerra Civil, o fluxo inumerável de emigrados do interior que passam de um Estado a outro, traficantes de todos os gêneros, desempregados e miseráveis improvisando expedientes para ganhar seu pão.
No centro desta afresco, Josey Wales, camponês vítima da guerra, que se tornou um fora da lei lendário. Contra sua vontade, ele se encontra à frente de um pequeno grupo de losers, desclassificados, de Índios e desenraizados que obtém rapidamente, graças à vontade do metteur em scène, a simpatia infalível do público. Um tom único de crueldade e humanismo mesclados percorre este filme comovente e ao mesmo tempo despido de toda sentimentalismo. O ponto de partida da intriga apresenta uma analogia provisória com Run of the arrow ( Fuller, 1956). Desgostoso com os vencedores, um vencido da Guerra Civil se imiscui nos territórios indígenas. Mas o que era fascinação pelo impossível, tentativa suicida e tragicamente patética para mudar de identidade da parte de Rod Steiger, o herói de Fuller, torna-se em Josey Wales projeto de vingança, eliminação dos fantasmas do passado e reconversão inteiramente bem-sucedidas.
É que a personalidade de Josey Wales é feita de realismo e justa apreciação do possível. Solitário na alma, individualista absoluto, buscando não se aliar a nenhum grupo racial ou social definido, ele consegue, contra sua vontade, fazer adeptos que reconhecem neste homem um companheiro seguro e um protetor. Este realismo, no entanto, só representa uma pequena parte do personagem, pois no tocante ao resto, tanto por sua força física, que beira a invulnerabilidade, quanto por sua força moral, que beira a infalibilidade, o mítico Josey Wales possui qualquer coisa de um deus. Característica habitual dos personagens encarnados por Clint Eastwood e que os faz ultrapassar os limites do racional. ( Este salto qualitativo fora do racional é o próprio tema de outro western seu, High Plains Drifter, 1973).
Formalmente, Clint Eastwood observou bem seus mestres. A Sergio Leone , que o “inventou” mas que não vale um décimo dele, ele assimila esta dilatação do tempo nos momentos de violência , através qual o personagem adquire uma dimensão quase sobrenatural. De Don Siegel,ele aprendeu o gosto da meticulosidade e esta busca pela tensão que progride de forma contínua de uma sequência à outra. Estas qualidades lhe permitem dar a unidade a um filme no qual as peripécias, os personagens se assemelham a um patchwork. Eles encarnam, com efeito, os fragmentos esparsos de uma América em farrapos, que apenas poderia reconstituir e retomar seu tecido vital se assimilasse todos seus excluídos. A dramaturgia e a mise em scène do filme estão, assim como suas intenções, em busca de uma unidade perdida.
Jacques Lourcelles, Dicionário de filmes.
Tradução: Luiz Soares Júnior.

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